terça-feira, 8 de julho de 2008

A grama do vizinho é sempre mais verde?

Muita gente cita a FDA (Food and Drugs Administration), a agência americana que corresponderia a nossa ANVISA, como um modelo de eficiência. Efetivamente o é, no que diz respeito à indústria farmacêutica. Porém a FDA dá baixíssima prioridade aos cosméticos não exercendo nenhuma atividade reguladora sobre esta categoria. Ao contrário da ANVISA, a FDA não exige testes de segurança antes que um cosmético seja colocado no mercado americano, nem os ingredientes são revisados ou controlados. Surpreso, leitor? Eu também fiquei! A FDA não tem poder para solicitar de livre iniciativa o recolhimento de produtos colocados no mercado, podendo somente monitorizar à distância as empresas que decidirem fazê-lo. E ela precisa de uma queixa pública para poder tomar uma iniciativa.
A coisa só fica diferente quando a FDA classifica o produto como um cosmecêutico. Nesta categoria o cosmético deve realizar algo mais além de limpar e perfumar. Deve propor uma vantagem curativa ou de tratamento. Bloqueadores e protetores solares se enquadram nesta categoria. Na verdade o que determina se um produto é um cosmético ou um cosmecêutico é a declaração de uso. Se você diz que um creme é cicatrizante de algo, ele é um cosmecêutico, se você diz que é um hidratante é um cosmético.
Mas qual é o motivo para esse pouco interesse? Porque se acreditava erroneamente que cosméticos fossem totalmente inóquos e que não afetariam nossa saúde e segurança. O conceito de que agentes nocivos podem passar a barreira da pele é relativamente recente. Foi somente após os anos sessenta do século XX que este conceito tomou forma por conta de uma substância denominada DMSO (dimetilsulfoxido) que provocou lesões oculares em coelhos e demonstrou ser carreada através da pele. Atualmente se considera que qualquer substância química há um potencial de absorção transdérmica. A prova está inclusive nos vários medicamentos que se encontram atualmente disponíveis como “patches” adesivos, seja para terapia hormonal, tratamento para fumantes, etc...
Apesar de disponíveis no mercado bons testes para monitorar a penetração cutânea destes agentes químicos e de testes para medir efeitos sistêmicos e degradação metabólica de um ingrediente cosmético, eles são raramente utilizados. Os consumidores e as indústrias estão legitimamente muito preocupados com as possíveis reações alérgicas e irritações cutâneas, imediatas e muito evidentes. Mas e a absorção sistêmica, toxicidade e efeitos crônicos desta exposição? Praticamente ninguém sabe quanto você realmente absorve para dentro do seu corpo quando passa um creme e ele permanece no seu rosto ou até na pele do corpo todo por horas. Imagine quantas vezes ao longo da vida nós fazemos isso. Imagine que as indústrias investem todos os dias em pesquisas para encontrar veículos que carreiem substâncias cada vez mais profundamente. Então, sabendo disso, faça as próprias contas.
Ainda nos Estados Unidos existe uma entidade, o CTFA, Cosmetics, Toiletries and Fragrance Association, associação dos produtores de cosméticos que por própria iniciativa instituiu um comitê de controle das matérias primas consideradas de risco, o CIR (Cosmetics Ingredients Review). Os relatórios deste comitê são elaborados por sete cientistas em um time multiprofissional. A partir destes relatórios a indústria americana se auto-regula. Esta foi uma medida para escapar a uma regulamentação governamental. A indústria paga aos cientistas para que sejam analisadas as matérias primas. Seria interessante se não houvesse claro conflito de interesse.
A COLIPA é a associação européia dos fabricantes. Geralmente é bem mais exigente. Compreende 23 associações nacionais entre os países europeus, mais 21 grandes multinacionais e 7 afiliados.
Recentemente a União Européia (UE) propôs o protocolo denominado REACH (Registration, Evaluation and Authorization of Chemicals), cujo objetivo é aumentar a proteção à saúde humana e ao ambiente através de uma identificação melhor e mais precoce das propriedades das substâncias químicas. A Agência de Química da UE seria responsável por reunir as informações completas (que seriam responsabilidade das indústrias) e mantê-las em um banco de dados. Se uma substância for definida como perigosa ela deverá ser eliminada no território europeu e substituída por outra mais segura. Mas existe um porém que vale a pena ser evidenciado. Nem sempre uma empresa européia usa os mesmos critérios e as mesmas matérias primas em todo o mundo. Normalmente elas se ajustam às agências reguladoras de cada país onde atuam.
Assim sendo o mesmo creme que na Europa pode satisfazer critérios restritivos na União Européia, pode apresentar uma formulação diferente aqui no Brasil ou nos EUA. E infelizmante não há nada, exceto a leitura atenta dos ingredientes, que possa fazer você perceber isto.

NA. Este texto é parte do livro "Mamãe passou Açúcar em Mim", copyright e todos os direitos garantidos para Sandra M. Goraieb, 2006. Para reproduções, consulte a autora.

2 comentários:

Anônimo disse...

Olá Sandra,

Li o seu blog e percebi que as suas idéias se coadunam com o que escrevi no meu livro:

Detetive da Beleza

Digo quais ingredientes cosméticos
podem contribuir positivamente para a saúde da pele, ou não.

Derrubo alguns mitos, e falo das profissões de beleza, maquiagem e muito mais.

Estive no programa do Jô Soares, você pode ver no meu blog:
http://detetivebeleza.blogspot.com/

Abraços,
Lucia Fagundes

Sandra Goraieb disse...

Olá, Lúcia!
Seja bem-vinda! Eu também escrevi um livro, que é o título deste blog. Mas não fui no Jô, hehehe.
Na verdade, é muito bom que as pessoas saibam mais sobre este assunto. Eu não conhecia o seu livro. Vou procurar conhecê-lo.
Deixe suas opiniões, se quiser sobre os temas.
Abraços.