terça-feira, 29 de julho de 2008

More or LESS (Lauril Eter Sulfato de Sódio)

(continuação do texto anterior)

Na cosmética, o principal representante dos surfactantes aniônicos é o Lauril Sulfato de Sódio.
Funcionalmente é um produto muito eficaz, economicamente muito viável como matéria prima, porém é um potente irritante da pele. Muito potente. Tanto ao ponto de uma comissão de cientistas reunidos pela própria indústria cosmética (CTFA/CIR) o considerar entre os produtos que merecem limitação em seus usos.
Observem que o próprio CIR faz diferença entre a molécula de Lauril Sulfato de Sódio e seus etoxilados (laureth, lauril éter sulfato de sódio). Elas realmente são moléculas diferentes e com diferentes implicações de risco. Portanto, um nome parecido não significa necessariamente o mesmo produto ou a mesma molécula.
Vamos começar pelo Lauril Sulfato de Sódio (Sodium Lauryl Sulfate, SLS) e o Lauril Sulfato de Amônio ( Ammonium Lauryl Sulfate, ALS). O CIR reporta o que foi publicado no Journal of the American College of Toxicology, Volume 2, Number 7, pp. 127-181, 1983 e diz o seguinte:

“ O Lauril Sulfato de Sódio e o Lauril Sulfato de Amônio são irritantes em patch testing (teste de irritabilidade) em concentrações superiores a 2% ou mais, e a irritação aumenta com a concentração do ingrediente. Em algumas formulações cosméticas entretanto esta propriedade irritante é atenuada. Quanto mais estes ingredientes encontram-se em contato com a pele, maior a chance de irritação, que pode ou não ser evidente ao usuário.
Embora o SLS não seja carcinogênico em animais de experimentação, ele se demonstrou capaz de causar graves alterações na epiderme da área de pele de camundongo onde foi aplicado. Este estudo indica a necessidade de estudos complementares para avaliar a sua possibilidade de potencializar a atividade cancerígena na pele. Estudos com auto-radiografia com marcador radioativo demonstrou uma grande deposição do detergente na superfície da pele e nos folículos pilosos; dano ao folículo capilar pode decorrer desta deposição.
Além disso, foi relatado que Lauril Sulfato de Sódio a 1% e 5% produziram comedões quando aplicados a orelha de coelhos albinos.
Estes dois problemas, comedões e perda de cabelos, devem ser considerados na formulação de cosméticos.
SLS e ALS parecem causar poucos danos potenciais quando são utilizados em produtos de uso discontínuo, de curta exposição seguidos de um enxágüe abundante da superfície da pele. Conclusão: o SLS e o ASL parecem ser seguros nas formulações utilizadas esporadicamente seguidas de enxágüe abundante. Em produtos para contato prolongado com a pele não deve exceder 1%.”

Vamos dar uma olhada no que eu grifei acima e analisar os fatos: as substâncias são sabidamente irritantes, causam alteração da epiderme por longo período de tempo com perda da função de barreira, causam dano ao folículo piloso, pode causar comedões e perda de cabelos. Curioso que depois de todos estes fatos estes compostos serem considerados pouco danosos e seguros, você não acha?
O mais importante é que em muitas formulações ele vem em seguida da água na lista de ingredientes. Isto indica que, se a empresa é honesta na listagem dos ingredientes, que existe nesta formulação um grande percentual de SLS. Como é um ingrediente relativamente barato, é muito difuso. A ANVISA afirma que o SLS, em base ao estudo publicado pelo CIR em 1983 é seguro até a concentração de 50%.
Em média, um produto comercial contém algo em torno de 30% de Lauril Sulfato de Sódio. Então quanto de SLS vem aplicado efetivamente sobre nossas peles e qual é a real quantificação do dano?
O SLS desnatura proteínas. Nossa pele e nossos cabelos contêm proteínas. Elas são a matéria prima da qual são feitos.
Quero deixar claro que o Lauril sulfato de sódio não é cancerígeno em si. O que ele faz é facilitar a penetração de substâncias que possam sê-lo e que estejam em contato com a pele.
Muito bem, existe solução para melhorar o Lauril Sulfato de Sódio de modo a que ele se torne menos irritante? Sim, tem, e se chama reação de etoxilação.

Etoxilação, uma paixão!

A reação de etoxilação é um processo químico que permite a fixação de uma ou mais moléculas de óxido de etileno sobre um composto químico (o mesmo vale para o óxido de propileno e se chama propoxilação). E é isso que faz com que a molécula de Lauril Sulfato de Sódio se torne maior e um pouco menos irritante. Muito útil para ser usado nas formulações infantis e para pessoas “sensíveis”. Lembre-se que a pele imatura do bebê não agüentaria uma boa dose de SLS e que uma boa parte dos produtos cosméticos tem necessidade de agentes tensoativos. Então o SLS vai ser substituído pelo Lauril Éter Sulfato de Sódio, ou Laureth.
Você vai tirar um suspiro de alívio, não é? Cedo demais para festejar. Esta reação produz durante o processo uma contaminação por uma substância denominada 1-4 dioxana.
Não confundir com dioxinas, que são outros compostos bastante danosos e que abordaremos em outro tópico.
Dioxanas ou dióxido de etileno são éteres incolores, líquidos em temperatura ambiente e pressões normais, inflamáveis e tóxicos, perigosos se inalados, ingeridos ou aplicados sobre a pele. Além de potencialmente cancerígenas, as dioxanas são genotóxicas (discretas).
Muito bom, não é? O mais interessante é que estes compostos etoxilados são muito difusos.
Você deve estar querendo saber como vai fazer para reconhecer uma molécula etoxilada ou propoxilada? Bem, não é tão simples, mas uma pista é procurar por finais terminados em eth, como laureth, mireth,... Eles também podem ser listados como PEG (polietilenoglicol), POE (poliortoester), ou compostos que contenham a palavra éter. É importante dizer que nem todos os éteres são etoxilados. Agora, vá ao seu banheiro e dê uma olhadinha na fórmula do seu xampu, do condicionador, do creme hidratante...

Uma enorme quantidade de produtos usa surfactantes etoxilados na sua formulação, coisas como laureth e polisorbatos (tweens). Estes ingredientes são quase sempre contaminados por concentrações relevantes de dioxanas que acaba imediatamente inalada (por ser volátil), e absorvida através da pele.
Ah, você vai dizer, isso é uma grande novidade, ninguém sabia disso até ontem. Não é bem assim. Este fato é de conhecimento público, só o público é que não o conhece.
A carcinogenicidade da dioxana em roedores foi estabelecida pela primeira vez em 1965 e confirmada em 1978, com predominância para cânceres nasais em cobaias e de fígado em camundongos. Ela também se demonstrou cancerígena sistêmica em estudo realizado pelo “National Cancer Institute” onde era “pintada” sobre a pele de animais de experimentação. Estudos sobre a absorção transdérmica demonstraram que a dioxana penetra rapidamente em pele animal e humana dos mais variados veículos, embora seja ainda incerto quanto seja absorvido e quanto evaporado.
Estudos epidemiológicos em seres humanos encontraram fortes evidências de ligação da dioxana com tumores de nasofaringe. Com estes resultados o Consumer Product Safety Commission concluiu que mesmo traços deste contaminante são motivo de preocupação.
Foram muitos os avisos de que os produtos infantis continham quantidades inapropriadas de agentes contaminantes até mesmo dentro do FDA.
Em setembro de 1992 o diretor da Divisão de Cosméticos do FDA, John Bailey, relatou a descoberta deste agente contaminante que parecia estar presente em cosméticos, especificamente em xampus e sabonetes líquidos para banho, condicionadores e xampus infantis. Na ocasião se sabia que a 1,4 dioxana causasse câncer de fígado em animais de laboratório desde um estudo do Instituto Nacional do Câncer realizado nos anos 70, e que quanto maior fosse o grau de etoxilação maior a probabilidade de ocorrência da contaminação por dioxana. Mais de dez anos depois as coisas não melhoraram muito, infelizmente. Os riscos permanecem inalterados.
Existe solução? Sim, existe. As dioxanas podem ser eliminadas em produtos etoxilados com um processo de remoção a vácuo ao final da polimerização denominado "stripping".
A pergunta a ser feita é: então por que ninguém faz?
A resposta talvez possa ser: porque custa, porque ninguém se importa, porque ninguém exige. Seria evitável, pense nisso.

NA. Este texto é protegido por direitos de Copyright e é parte do livro "Mamãe passou açúcar em mim", de Sandra Goraieb, 2006. Para reproduções consulte a autora.

4 comentários:

thais disse...

Eu fiz uma pesquisa sobre ele no final de semana. Hoje abri o seu livro pra pesquisar mais, mas acabei não conseguindo ler direito.
Li agora, aqui no blog. Puxa vida, TUDO o que eu tenho aqui em casa (dos adultos) tem LSS. Até os Granado, que eu adorava pra mim, têm.
Ai ai ai....

beijo
PS: posso fazer post e colocar link pra esse post?

Sandra Goraieb disse...

Thais, claro que pode. A informação é nossa única arma de defesa. Só quem sabe pode escolher de forma responsável. E são nossas escolhas, boas ou ruins que vão fazer diferença.
Não escrevi o livro para mim, escrevi para as pessoas.
Super beijo.

Anônimo disse...

Olá..sei que o seu comentário já tem uns meses mas achei-o interessante..a questão é: mesmo que nao escolhamos produtos que contêm lss mas os outros k substitui essa substãncia mas se esses outros contraem essa dioxana, então que devemos usar?

Sandra Goraieb disse...

Você pode optar por outras categorias de surfactantes, como o Decil Glucosídeo, por exemplo. Outra coisa seria escrever ao sac da empresa e perguntar se o produto é "dioxana free". Isto se já não estiver escrito no rótulo.
Abraços!