quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Mais uma história de todos os dias

Era uma vez um senhor, que aqui chamaremos de N*, 64 anos, muitos deles passados no trabalho rural. Ex-tabagista, até que o cigarro tivesse causado um carcinoma epidermóide em sua boca. Processo que fez com que N se submetesse a uma cirurgia há alguns anos.
N trabalhava faz 6 anos como caseiro, em um sítio, fazendo os trabalhos típicos desta profissão. O patrão de N andava insatisfeito com ele, pois N andava um pouco desleixado e resolveu demití-lo, então o chamou e lhe deu o aviso prévio. N assinou o aviso e então disse: "Doutor (o patrão era doutor), eu ando com uma dor forte de dente, uma inflamação, o que o senhor acha que eu posso tomar?". Neste momento o doutor pediu para ver a lesão e ficou chocado, havia uma lesão inflamatória de fato, mas mais do que isso, havia uma lesão ulcerada, profunda, sugestiva de rescidiva. O patrão mandou o senhor N imediatamente ao posto de saúde para que fosse encaminhado para tratamento.
Ao apresentar-se no INSS, a (im)perícia o considerou apto para o trabalho.
Apesar de atestados dizendo que o sr N possuia uma doença cujo tratamento era radioterapia, quimioterapia e cirurgia, nenhum deles descreveu que a DOR que N sentia era incapacitante para o trabalho e que necessitava de afastamento de suas atividades.
O fato é que N usa 30 mg de morfina e outros 4 analgésicos potentes sem alívio.Para estes "doutores" é impossível perceber e atestar que DOR incapacita e torna um sujeito que lida com máquinas e objetos de corte (foice, facão,enxada,...) incapaz para sua atividade.
N é mais um "segurado da previdência" que está à mercê da incompetência do sistema, esperando a sua sorte. Até que algo de pior aconteça.

Eu fui médica fiscal na Itália.
Esta figura profissional serve a corrigir e compensar estas incongruências de prognóstico médico e prognóstico laborativo e tornar a sociedade, o trabalho e a medicina mais justa.
O que estão fazendo com o sr N é simplesmente desumano! Estava na hora que por aqui começássemos a pensar nisto também.

* a história acima é verdadeira, apesar de parecer absurda. Os nomes foram omitidos para preservar a privacidade dos envolvidos.

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